Entre os indicadores que ajudam a compor a radiografia da economia brasileira, há um que vem preocupando cada vez mais os analistas: a relação entre a dívida bruta e o Produto Interno Bruto (PIB). Em clara tendência de alta, o número é acompanhado com lupa pelo mercado financeiro, pois indica a capacidade que o país tem de cumprir suas obrigações com investidores.
Segundo os dados mais recentes, de maio, essa proporção está em 62,5%. Esse número recua quando o governo consegue poupar para pagar os juros e quando a economia cresce. Mas tende a aumentar quando o oposto ocorre: contas públicas em desequilíbrio e atividade econômica fraca, justamente o cenário atual do país. Com isso, já há economistas que preveem que o indicador chegará a 70% em 2017, um patamar não visto desde 2004.
Ter uma dívida alta em relação ao tamanho da economia não é necessariamente um problema, afirmam especialistas. No Japão, por exemplo, essa relação beira os 200%. Nos EUA, maior potência mundial, é da ordem de 100%. O que ameaça o equilíbrio da economia, no entanto, é a velocidade com que essa dívida cresce - ritmo influenciado diretamente pelos juros reais, altos no Brasil e muito baixos nos países ricos.
— No Brasil, o juro real é muito alto, na faixa de 9%. Se cair para 5%, o saldo primário (economia para pagar os juros da dívida) tem de ser na faixa de 3% do PIB. Esses países (Japão e EUA) operam com juro zero. Eles podem até ter déficit primário que não tem problema - explica o economista Carlos Thadeu de Freitas, ex-diretor do Banco Central.
Para Mansueto Almeida, economista especializado em finanças públicas, as projeções do governo, que pretende encerrar o mandato com dívida em cerca de 66% do PIB, são otimistas. Ele destaca que as contas da equipe econômica preveem uma queda forte dos juros, o que pode não ocorrer.
— Se o juro real não cair tanto, essa dívida passa tranquilamente a 72% no fim do governo (em 2018). Ano que vem, pode ir para uns 69% — estima.
Trata-se de um equilíbrio difícil de ser alcançado pela equipe econômica. A elevação dos juros faz a bola de neve da dívida crescer mais rapidamente. Mas a taxa de juros tem sido justamente um dos instrumentos usados pelo Banco Central para mostrar ao mercado seu compromisso com o combate à inflação e, com isso, fazer as projeções para a alta de preços melhorarem - é o que os especialistas chamam de “ancorar expectativas”.
— Para quebrar isso, é preciso um choque de confiança, um ajuste fiscal digno desse nome, e uma reviravolta na política monetária. Essa coisa de continuar aumentando juros como se a demanda já não estivesse na lama e não fossem os preços administrados os responsáveis por pressionar a inflação é um disparate - defende o economista Felipe Salto, também especialista em contas públicas.
Thadeu de Freitas destaca que, embora a trajetória do indicador preocupe, o Brasil não deve ver uma disparada tão rápida da dívida. Mas ele destaca que o país é muito dependente do financiamento externo. E, como a situação da dívida é um dos indicadores mais observados pelas agências de classificação de risco, perder o grau de investimento — espécie de selo de bom pagador - causaria um impacto na economia:
— Hoje, 22% (da dívida) estão nas mãos de não residentes, temos essa dependência internacional. Esse é o ponto mais importante hoje. Se perder grau de investimento, a maior parte não pode comprar essa dívida, e o dólar sobe.